Alessandro Faleiro Marques*
Como torço por sua vitória nas eleições, já vou chamar-lhe de
Excelência, para o senhor ir se acostumando com o justo título.
Sinceramente, não tenho medida do quanto é difícil disputar esse
vestibular da democracia. Muitos comícios, argumentos,
contra-argumentos, e o pior, ter de viver num ambiente repugnante para a
maioria das pessoas. Tenha paciência e seja persistente. Excelência, em
muitas nações, há lutas sangrentas para a conquista do direito que,
nós, eleitores, muitas vezes desdenhamos por aqui. Possamos aproveitar bem essa
oportunidade.
O senhor é honesto, trabalhador, consciente da missão de serviço a qual
se propõe. Se me permite, Excelência, gostaria de dar-lhe um fraternal
conselho: cuidado com o eleitor ficha suja, corrupto, de alma imunda,
propagador das misérias e das injustiças de cada dia. Semana passada,
outro candidato merecedor do título com que lhe honro confessou-me estar
revoltado. Foi abordado por uma senhora, e esta lhe pediu um caminhão
de areia em troca do voto. Ainda chocado pela imoralidade da mulher até
outrora respeitável, ele me disse tê-la mandado para o inferno. Achei
isso maravilhoso! O senhor também faria isso, mesmo com outras palavras,
tenho certeza.
Já ouvi de alguns vizinhos a queixa de que não ganham mais nada,
perderam o “direito” de ver aquela dupla sertaneja famosa aqui, bem
perto de casa, de graça. “Não se fazem eleições como antigamente”,
dizem. Pois é, Excelência, agora posso ouvir, sem confetismos, o que o
senhor e os outros candidatos têm a dizer. Suas propostas para cuidar da “res publica”, a coisa de todos.
Eu estava pensando... o desonesto deve adorar essa história de todo
político ser chamado ladrão. Isso serve para enfraquecer as propostas de
mulheres e homens sérios e fortalecer os adoradores do egoísmo, da
antivida e da injustiça. Quando se generaliza, colocam-se todos como
“farinha do mesmo saco”, abafando-se quem quer trabalhar. Mais uma vez,
suplico ao senhor: tenha persistência e coragem. Sou testemunha de seu
empenho em favor da vida em abundância, sobretudo para os mais fracos.
Eu apoiarei seu protesto contra o eleitor corrupto, principalmente
contra aqueles com esclarecimento suficiente para ter ideia dos próprios
atos. Prometo não render mais conversa quando alguém chegar falando mal
dos políticos. Denegrirei quem deixa de votar em pessoas como o senhor e
escolhe os que se corrompem. Se uma pessoa eleita é ruim, muitas vezes
ela o era assim antes. Pilantra é quem, sabendo disso, insiste em
mantê-la em tão honorável serviço.
Cá entre nós, o senhor acharia ser preciso existir uma lei contra
candidatos “ficha suja”? Se os cidadãos levassem a sério a importância
da escolha dos próprios representantes, a legislação seria apenas um
apoio para proteger os mais débeis ou distraídos. O mesmo candidato que
xingou a mulher corrupta me contou que, no partido em que é filiado,
sobraram apenas sete candidatos de uma lista de oitenta. Se o povo fosse
mais cuidadoso, os setenta e três barrados sequer tentariam se
inscrever, pois teriam a certeza de não serem eleitos.
Desejo ao senhor muita sorte e, aos meus irmãos eleitores, muito juízo. Quanto aos sujos, todos eles, vassoura!
* Alessandro Faleiro Marques é professor, redator e revisor de textos. Texto original publicado no site Caos e Letras (www.caoseletras.com).